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Conheça o Cemitério dos Escravos em Santa Luzia

 

O Cemitério dos Escravos em Santa Luzia está localizado em uma área rural, a 7 quilômetros do Centro Histórico. A construção é pequena, de aproximadamente 20 metros quadrados cercados por muro de pedras. Ele foi tombado pelo município em novembro de 2008.

No local não existem lápides e túmulos, como nos cemitérios convencionais. Há apenas um cruzeiro em madeira, uma pequena porta e um caminho cimentado. Álvaro Diniz, 75 anos, é o dono das terras onde fica a construção. Ele conta que tem mais de 50 negros enterrados no local.

Álvaro é bisneto de um dono de escravos de Santa Luzia e narra que o bisavô fez questão de fazer um campo santo para sepultar seus escravos.

Propriedade familiar

De acordo com a historiadora Neise Mendes Duarte, pesquisas realizadas nos registros de óbitos de Santa Luzia evidenciaram a ocorrência de sepultamentos entre os anos de 1810 e 1855 no Cemitério José Nunes Moreira, que mais tarde aparece como a fazenda de João Nunes Moreira, bisavô do Álvaro Diniz.

José era o tataravô de Álvaro e vendeu as terras para o filho, João. Todos os funerais levantados nessa propriedade eram de escravos.

Celebração em homenagem aos pretos

Álvaro relata que, em 1987, o cemitério foi restaurado pelo prefeito da época, a pedido de sua mãe, que estava com 97 anos e queria celebrar uma missa no dia de Finados. A partir desse ano, tornou-se uma tradição da família realizar a missa todo ano, dia 02 de novembro, às 16 horas, incluindo um café servido para a comunidade, como fez a mãe de Álvaro na primeira missa.

Por volta de 15 anos atrás, o padre João Lucena, da Paróquia de São Raimundo Nonato, do bairro São Benedito, em Santa Luzia, assistiu a missa e passou a incluir uma celebração afro em homenagem aos negros enterrados ali.

Proprietário mantém cemitério preservado

Álvaro diz que, hoje em dia, é ele quem se responsabiliza pela preservação do local. “Todo ano eu tenho que dar uma regularizada. Faço isso primeiro em homenagem ao que minha mãe pediu. Segundo porque, apesar de estar tombado, o município não cuida”, diz.

O dono das terras relembra as histórias contadas pelos antepassados e fala sobre o escravo Zé Tomaz. “Na Revolução de 1842, ele enterrou toda a prataria e tudo que tinha de valor do meu bisavô e escondeu no mato”, recorda, com emoção.

Cemitério é aberto para práticas religiosas

Depois disso Zé Tomaz foi alforriado e passou a fazer parte da família. Ele é um dos negros que está sepultado ali. “Esse cemitério é um pedacinho da nossa história e como luziense eu procuro da melhor forma possível conservar e mostrar porque aqui existe”, fala Álvaro.

O Cemitério fica disponível 24 horas para visitação e a entrada é franca. Diversos rituais, oferendas e eventos religiosos são praticados no local por pessoas que acreditam que as almas dos escravos tomam conta do lugar, que se tornou sagrado.

Fonte: ANF














177 Anos da Batalha de Santa Luzia

 

A 4ª Região Militar (4ª RM) e a Prefeitura de Santa Luzia realizaram, no dia 20 de agosto de 2019 (antes do início da Pandemia de Covid-19 no Brasil), uma solenidade cívico-militar em homenagem aos 177 anos da Batalha de Santa Luzia, um dos episódios que compõem a história das revoltas liberais de 1842 e um dos mais importantes fatos da história de Minas Gerais.

Nessa Batalha, as tropas imperiais, comandadas pelo então Brigadeiro Luiz Alves de Lima e Silva, Barão de Caxias, defrontaram-se com as forças rebeldes lideradas por Teófilo Ottoni.  Após duros combates, as tropas do futuro Duque de Caxias sagraram-se vencedoras, pacificando a província de Minas Gerais.

A solenidade, presidida pelo General de Divisão Altair José Polsin, Comandante da 4ª Região Militar, reuniu cerca de 500 pessoas, entre estudantes e autoridades do município de Santa Luzia.  A tropa foi formada por representações da Companhia de Comando da 4ª Região Militar e da 4ª Companhia de Polícia do Exército.  Prestigiaram com suas presenças os Comandantes das organizações militares da guarnição de Belo Horizonte.

Fonte da Reportagem em 2019

Santa Luzia e as perspectivas da Revolução Liberal de 1842

 

O   arraial   de   Santa   Luzia,   fundado   em   1692, aproximadamente,    se    inseriu    facilmente    nas principais  rotas  comerciais  da  Estrada  Real,  devido ao  seu  posicionamento  geográfico  estratégico.  Em pouco  tempo,  o  povoado  ganhou  importância  e visibilidade   na   região   nos   oitocentos,   tornou-se arraial e, em 1856, tornou-se uma vila independente, separando-se  de  Sabará  e  consolidando-se  como importante centro comercial. Neste mesmo período, ocorreu  um  dos  principais  movimentos  liberais  no Império, afetando províncias e arraiais, principalmente  no  sudeste  do  Brasil,  a  Revolução Liberal   de   1842.   Será   discutido   nesse   artigo   o contexto  social,  econômico  e  político  luziense  do século XIX e sua inserção na Revolução Liberal; que alterou  a  dinâmica  da  vida  na  vila  de  Santa  Luzia. Além de uma discussão historiográfica sobre como a Revolução  Liberal,  é  percebida  pelos  autores  de diferentes  vertentes  historiográficas,  demonstrando como  podemos  perceber  esse  movimento  sob  um olhar regional.

INTRODUÇÃO

Pertencente  a  Sabará  até  o  século  XIX,  Santa  Luzia  se  desenvolveu  como  importante centro comercial nas proximidades com o rio, que mais tarde foi denominado Rio das Velhas, devido à sua posição geográfica privilegiada, incorporada no que se convencionou chamar de Estrada  Real.  Subordinada  à  vila  de  Sabará,  que  se  destacava  no  período  por  sua  intensa atividade aurífera e por abrigar a Intendência e a Casa de Fundição da região, que são órgãos da  coroa,  responsáveis  por  regulamentar  a  exploração,  distribuição  e  circulação  dos  metais preciosos.  

Como  os  demais  arraiais  oitocentistas,  Santa  Luzia  era  composta  por  um  centro urbano rodeado por uma zona rural, onde havia  a predominância da população  cativa. Havia certa equidade entre a quantidade de homens e mulheres, como sinalizado por Corrêa(2005). 

A economia luziensese baseava na escravidão, no comércio e na indústria têxtil.O nome da cidade  mudou  ao  longo  do  tempo,  mas  a  memória  registrou  Santa  Luzia,  na  História,  como palco da Revolução Liberal de 1842. É entre as disputas políticas e econômicas que, em 1842,iniciam-se as batalhas relativas à Revolução Liberal, em Santa Luzia. Esse processo precisa ser entendido como parte de um projeto político maior, que envolvia outras províncias e regiões do Brasil que nasceu a partir da polarização  entre  Liberais  e  Conservadores,  intensificado  durante  a  passagem  do  Período Regencial para o Segundo Reinado.

Dessa  forma,  buscar-se-á  compreender  como  essas  batalhas  influenciaram  a  vida cotidiana  dos  luzienses,  seus  desdobramentos  e  influências  políticas,  sociais  e  na  própria história  da  cidade,  visto  que,  até  hoje,  relatos  das  batalhas  se  fazem  presentes  na  região,  por meio da oralidade, compreendendo assim, que a história local não está alheia a história nacional, haja visto dos movimentos de interferência entre ambas.

Também  nos  propusemos  a  realizar  uma  revisão  bibliográfica  acerca  das  narrativas produzidas  sobre  a  Batalha,  apresentando  as  diferentes  perspectivas  historiográficas  de  tal evento,  buscando  entendê-lo  sob  uma ótica local.  Para  isso,  utilizamos, principalmente,  os textos escritos por Villa (2019), e Corrêa(2005). 

Este artigo é fruto de pesquisas relacionadas ao projeto de pesquisa de dois graduandos voluntários  no  PROBIC  da  Pontifícia  Universidade  Católica  de  Minas  Gerais,  cujo  tema principal  é  a  análise  da  influência  da  baronesa  Maria  Alexandrina  na  sociedade  luziense oitocentista.

O PACATO VILAREJO LUZIENSE

Em  meados  do  século  XVII,  com  a  queda  na  exportação  do  açúcar  e  o  início  dos primeiros achados auríferos, o objetivo da coroa era estabelecer, no território brasileiro, uma colônia  de  exploração  e  não  de  povoamento.  

Portugal  via  nas  terras brasileiras,  levando  em consideração  o  contexto  mercantil  da  época,  a  oportunidade  de  explorar  metais  preciosos, principalmente. Dessa forma, como demonstrado por Assunção (2020), grande parte das vilas mineiras se formou a partir das atividades bandeirantes e é nesse contexto que os paulistas se instalaram na região do Rio das Velhas, próximo à Santa Luzia. O bandeirante Manoel de Borba Gato, em uma de suas expedições, fundou, por volta de 1692, o arraial de Santa Luzia, que, rapidamente, se inseriu nas principais rotas comerciais da Estrada  Real,  devido  ao  seu  posicionamento  geográfico  estratégico. 

Então,  entende-se  que  o sítio era favorável a esse assentamento, uma vez que“ o sítio de uma cidade pode ser entendido como  o  conjunto  de  elementos físicos  e  naturais  que  possibilitam  o  assentamento  humano  e posterior modificação de acordo com as necessidades da sociedade.” (BORSAGLI, CASTRO, 2019, p.136).

A posição geográfica luziense não foi aleatória, pois, além de fatores naturais, o arraial se formou próximo a zonas comerciais, favorecendo, então, seu desenvolvimento, tendo com isso uma “possibilidade de comunicação com outros assentamentos humanos” (BORSAGLI; CASTRO, 2019, p.136)  Com isso, Assunção (2020) pontua que:

Além  de  sua  posição,  Santa  Luzia  destacou-se  inicialmente  por  conta  de  um  meio físico favorável. O seu distanciamento em relação à Cordilheira do Espinhaço fez com que  a  várzea  do  rio  naquela  região  se  tornasse  maior,  como  apontado  por  Goulart (2009) e, com isso, mais propícia ao estabelecimento humano. Além disso, a cidade situa-se próxima a um ponto de descontinuidade das altas altitudes do Espinhaço, o que  facilitava  a  aproximação  com  outras  cidades  que  compunham  a  Estrada  Real (ASSUNÇÃO, 2020, p.31).

Tendo  isso  em  mente,  durante  o  ciclo  do  ouro,  Santa  Luzia  estabeleceu-se  como importante  centro  comercial,  oferecendo  recursos  aos  viajantes  que  seguiam  pelas  rotas  da Estrada Real, pois se localizava como ponto crucial na travessia Ouro Preto Diamantina, além de  possibilitar  fácil navegação  entre  o  Rio  das  Velhas  e  o  São  Francisco.  Dessa  forma,  a economia luziense estava mais voltada para o comércio e abastecimento interno, diferentemente de  outros  arraiais  do  século  XVIII,  que  se  dedicavam,  quase  exclusivamente,  à  mineração. 

Outro fator interessante, discutido por Assunção (2020), no que diz respeito a essa característica comercial e de subsistência de Santa Luzia, é que:

“[...] o período de extração do ouro foi capaz de gerar intensos fluxos migratórios para as Minas e estabeleceruma forte economia voltada para o mercado externo, segundo era a orientação de toda a colônia"[...](ASSUNÇÃO, 2020. p. 34 apudPRADO JÚNIOR, 1992).

Dessa  forma,  depreende-se  que  Santa  Luzia  gerava  excedentes  de  mercadorias  que faziam parte do fluxo do comércio geral da colônia,e também das exportações para a coroa, inserindo-se, com isso, em uma rede comercial mais ampla. Essa percepção da economia agropastoril, mesmo durante os primórdios e no auge do período aurífero, é reforçada pelo revisionismo histórico dos anos 1980 que, a partir de análises regionais, econômicas e demográficas, revisita temas do passado colonial e imperial. Autores como Laura de Mello e Souza (1983), e Júnia Furtado (1999) produziram estudos, a partir da perspectiva revisionista, demonstrando a pluralidade existente na região das Minas e afirmando a dinamização agropastoril, entre outros aspectos. Santa Luzia, assim como outras regiões das Minas, tinha uma produção que abastecia o mercado interno do povoado e de seu entorno. Ainda assim, o arraial luziense permanecia sob domínio da Vila de Sabará, que se configurava como uma das principais cidades mineiras, devido à intensa exploração aurífera nessa região, além de abrigar a Casa de Fundição e a Intendência, órgãos responsáveis por controlar a produção e circulação de metais preciosos nesse período. A ruptura entre Santa Luzia e Sabará, no séculoXIX, se deu, de acordo com Assunção (2020),  após  uma  série  de  conflitos  entre  as  elites  mineiras.  

Os  luzienses  reivindicavam  sua emancipação  usando  justificativas  como  a  dificuldade  do  acesso  à  Vila  de  Sabará  e, principalmente, devido a sua posição geográfica estratégica em relação às rotas comerciais. A emancipação  era  desejada,  pois  a  elite  queria  se  inserir  de  maneira  autônoma  nos  processos políticos. A primeira tentativa real de emancipação se deu em 1760, contudo a coroa portuguesa recusou  a  petição. Somente  em  1858  Santa  Luzia  conseguiu  se  emancipar  de  Sabará,  sob protestos e resistências, pois Sabará lucrava com as atividades comerciais luzienses. 

Como apontado por Assunção (2020):

“[...] conclui-se previamente que a formação de Santa  Luzia  como  cidade  se  dá,  nesse  momento,  exclusivamente  por  prestar  suporte  à infraestrutura  espacial  e  hidrográfica  necessárias  à  essa  economia,  tanto  em  termos  de  sítio geográfico como de posição.” (ASSUNÇÃO, 2020, p. 34)

Outrossim, a respeito da sociedade luziense nos séculos XVIII e XIX, pode-se dizer, de acordo  com  Corrêa  (2005),  que,  no  comércio,  predominavam  os  homens  livres  e  que  as mulheres,  livres  e  escravas,  ficavam  restritas  às  ocupações  na  indústria  têxtil  e  às  atividades domésticas. Assim como nos demais arraiais oitocentistas, Corrêa (2005) observa que havia um centro  comercial  urbano  rodeado  por  uma  zona  rural,  onde  predominava  a  população  cativa, Formada, em sua maioria, por homens. Vale ressaltar que toda a economia local se sustentava no escravismo. Sobrea análise da ocupação do distrito, a autora afirma:

A  análise  das  ocupações  dos habitantes  do  Distrito  parece  corroborar  a  hipótese  de uma  economia  dinâmica, voltada para  o  artesanato  e  o  abastecimento  interno. Encontramos  uma  grande  variedade  de  ocupações,  dentre  as  quais  vários  ofícios ligados ao artesanato (alfaiate, sapateiro, carapina, seleiro, valeiro, santeiro, para citar alguns)  e  uma  relativa  diversificação  profissional,  com  presença  de  eclesiásticos, vários  músicos,  quatro  boticários,  dois  cirurgiões,  dois  juízes  de  vintena,  e  até floristas.(CORRÊA, 2005, p. 33).

Ademais,  a  população  adulta  luziense  era  composta,  em  sua  maioria,  por  pessoas  em situação de escravidão, ocorria uma distribuição de sexo equilibrada, em comparação às pessoas em situação de liberdade (CORREA, 2005, p. 6). 

Até os 16 anos, havia certa equidade entre a porcentagem de homens e mulheres na sociedade, contudo, após essa faixa etária, havia uma predominância  feminina,  Corrêa  (2005)  explica  essa  ausência  masculina  a  partir  de  alguns fatores como um:

[...] possível movimento migratório dos homens para outros locais. Um outro motivo para  essa  escassez poderia  ser a  evasão durante  períodos de recrutamento militar, e havia  também  a  questão  do  nomadismo.  Outro  fator  para  a  ausência  masculina: homens possuíam terras fora do distrito ali residindo, deixando apenas as mulheres e seus filhos no arraial. (CORRÊA, 2005, p. 34-350)

A  análise  do  Censo  de  1872  confirma  a  hegemonia  feminina  na  vila,  não  só  entre escravos  e  livres,  mas  entre  a  população  em  geral:  eram  3.128  mulheres,  o  correspondente  a 51,6%. Os homens eram 2.943, ou seja, 48,4%. Também a análise sobre letramento e estado civil confirma as percepções demográficas comuns nas vilas mineiras. Havia mais solteiros do que casados (34,5% dos homens e 35% das mulheres eram solteiros, enquanto apenas 12% da população  era  constituída  por  casados).  Os  homens  que  sabiam  ler  superam  as  mulheres  em quase cinco vezes (6,5% dos homens de Santa Luzia sabiam ler e escrever contra apenas 1,4% das mulheres).



Finalizado  o  desenho  demográfico,  é  nosso  foco  aqui  entender  como  esses  dados impactam a realidade social, urbana, política e econômica que vai culminar na defesa liberal, marca da Revolução de 1842. A tendência liberal da Revolução e sua acolhida pela cidade se confirma quando compreendemos a conjuntura social e os interesses dos grupos econômicos e intelectuais  que  tinham  em  sua  base  os  homens  de  negócios.  Nessa  perspectiva,  os  aspectos demográficos, com destaque para a presença de escravizados ainda de forma significativa no final do XIX, indica a importância econômica central que vai nortear os discursos políticos em defesa  da  maior  autonomia  provincial  e  da  redução  de  restrições  comerciais,  facilitando  as exportações intraprovinciais e externas.

A BATALHA, OS “LUZIAS” E SUA INFLUÊNCIA NA SOCIEDADE LUZIENSE

O movimento liberal de 1842 deve ser entendido como parte de um processo político maior, tendo  se  iniciado  em  São  Paulo  e  se  expandido  até  Minas  Gerais  e que  se  deu  com  a polarização  entre  as  forças  Liberais  e  Conservadoras  durante  a  transição  entre  o  Período Regencial e o Segundo Reinado. Nesse período, nota-se uma disputa política entre esses dois principais grupos, fazendo eclodir motins e revoltas em diversas províncias e vilarejos. Ademais, Villa (2019) analisa o envolvimento dos sabarenses com a política nacional a partir  de  1822,  anos  antes  da  revolução  de  1842,  quando  se  tornou  mais  perceptível  a instabilidade do contexto político, demonstrando que os sabarenses passaram a buscar meios de  se  integrarem  aos  grupos  políticos  ativos  e  que,  possivelmente,  atuariam  nos  próximos governos. É nesse cenário de instabilidades e de busca por participação política que a Revolução Liberal  de  1842  deve  ser  compreendida  como  um  movimento  que  interliga  acontecimentos numa escala macro e micro. Os liberais orquestraram e aplicaram o Golpe da Maioridade, que colocou D. Pedro II no  poder  com  apenas  14  anos.  Contudo,  após  se  estabelecer  como  Imperador,  D.  Pedro  II assumiu uma postura política que se aproximava das demandas dos conservadores, deixando os liberais completamente insatisfeitos. A  partir  disso,  as  elites  paulistas,  segundo  Villa  (2019),  nomearam Rafael  Tobias  de Aguiar  para  a  Presidência  Interina  da  Província.  Os  combates  começaram  em  Sorocaba,  e terminaram em 20 de junho com a vitória dos Legalistas sob o comando do Barão de Caxias, Luís  Alves  de  Lima  e  Silva.  A  província  mineira  também  nomeou, em  Barbacena,  José Feliciano Pinto Coelho da Cunha como Presidente Interino. Os embates começaram na Comarca do Rio das Mortes com significativas vitórias das tropas liberais, conhecidos como luzias, contudo, o palco da revolução foi se transferindo para o Rio das Velhas (VILLA, 2019, p. 6)
4. Os Liberais ocuparam Caeté e Sabará e estabeleceram Câmaras Municipais Intrusas nas duas regiões. Após pacificar a situação em São Paulo, o Barão de  Caxias  partiu  em  direção  à  província  mineira  com o  mesmo  objetivo,  reprimir  as  tropas liberais, chegando em Ouro Preto no dia 6 de agosto. As tropas liberais, de acordo com Villa (2019), se transferiram para Santa Luzia em 14 de agosto, se preparando estrategicamente para a última batalha contra as tropas do Barão de Caxias, que no dia 20 de agosto de 1842 se instalou nas entradas do arraial luziense. Vejamos: 

Caxias dividiu sua força militar em três colunas: uma comandada pelo Coronel José Joaquim de Lima e Silva seguiria pela estrada do arraial da Lapa; outra, sob o comando 

4 De acordo com BARATA (2011), a insatisfação dos liberais com a atuação do Gabinete palaciano de 1841 vai gerar um desgaste político e uma demarcação política importante entre os dois grupos (liberais e conservadores). Iniciada em São Paulo, e em apoio aos paulistas, os liberais proclamaram em Barbacena, em 10 de julho de 1842, o tenente coronel José Feliciano Pinto Coelho da Cunha, o futuro Barão de Cocais, como presidente da província, confrontando  Bernardo  Jacinto  Veiga  que  havia  sido  nomeado  pelo  imperador  e  empossado  em  Ouro  Preto.  A ascensão de Coelho da Cunha veio acompanhada pela criação do Corpo de Guardas Municipais, em substituição à Guarda Nacional e a determinação da desobediência às autoridades criadas pelas leis n.234/1841 e n.261/1841, que  reestabeleceram  o  Conselho  de  Estado  e  Reformaram  o  Código  de  Processo  Criminal  respectivamente. Assumiram  São  João  Del  Rei  e  garantiram  a  adesão  de  muitos  municípios  mineiros  (Pomba,  Queluz,  Airuoca, Lavras, São João Del Rei, São José Del Rei, Baependi, Santa Bárbara, Santa Quitéria e Curvelo). Mesmo com a derrota em São Paulo e o isolamento, deram prosseguimento à revolta e, conciliando vitórias e derrotas até serem derrotado em 20 de agosto, em Santa Luzia.

do Coronel  Francisco de  Assis Ataíde, em direção ao Rio das Velhas,  enquanto ele próprio avançaria contra a posição rebelde através da estrada de Sabará [...] Na manhã do  dia  20  de  agosto,  Caxias  investiu  sobre  os  revoltosos  empregando  a  tática  do envolvimento  [...]  As  baixas  das  forças  imperiais  foram  mínimas,  totalizando  72 mortos  e  feridos;  enquanto  os  rebeldes  perderam  60  mortos,  100  feridos  e  300 prisioneiros.  Os  vencidos,  entre  os  quais  se  encontravam  Teófilo  Ottoni  e  Camilo Maria Ferreira Armond (conde de Prados) foram enviados para a prisão em Ouro Preto e Barbacena.(DARÓZ, 2014, p. 571)Depois dos processos de julgamento foi concedido aos revoltosos a anistia através do decreto n° 342 (apudVILLA, 2019, p.78), expedido em 14 de março de 1844, pelo Imperador D. Pedro II.

Art. Único. Ficam anistiados todos os crimes políticos cometidos em o ano de 1842 nas Províncias de São Paulo e Minas Gerais, e em perpétuo silêncio os processos que por motivos deles tenham instaurados. Manuel Alves Branco conselheiro de Estado, ministro e secretário de Estado encarregado interinamente dos Negócios da Justiça, o tenha assim entendido e faça executar. Palácio do Rio de Janeiro, em 14 de março de 1844, vigésimo terceiro da Independência e do Império. (VILLA, 2019, p. 79)

Mesmo  após  178  anos,  a  batalha  entre  liberais  e  conservadores  ainda  faz  parte  do imaginário  luziense,  principalmente  por  meio  da  história  oral.  As  famílias  mais  tradicionais preservam   as   memórias   e   as   narrativas   acerca   desses   acontecimentos,   que   alteraram significativamente a dinâmica da sociedade no período. Villa (2019), em seu livro “Horizonte de eventos da batalha de Santa Luzia”, demonstra que a violência não ficou restrita aos campos de  batalha,  mas  se  estendeu  por  todos  os  âmbitos  da  vila,  alterando  até  mesmo  as  relações econômicas, pois foi necessária uma logística para sustentar as tropas envolvidas. Cabe  ressaltar,  como  demonstrado  pelo  autor,  que  a  maior  parte  da  população  estava alheia aos acontecimentos políticos que motivaram tais conflitos, devido aos baixos índices de educação,  como  podemos  notar  no  gráfico  1 –ver  seção  anterior -a  grande  maioria  da população era analfabeta, e também devido à dificuldade para a circulação de notícias. Neste contexto  histórico,  o  jogo  político  estava  reservado  às  elites  locais,  que  eram compostas pelos protagonistas do sistema,-que o eram seja por deterem poderio econômico ou pela força das tradições e títulos-, perspectiva que perdura até as primeiras décadas da república, como apontado pelo historiador José Murilo de Carvalho (2019) em “Os Bestializados_ O Rio de Janeiro e a república que não foi”, que, apesar de ter como tempo histórico o final do século XIX, nos ajuda a entender como foi formada uma população civil que era inativa e excluída do processo político.

Contudo, nota-se um esforço de ambos os lados, liberais e conservadores, para depreciar a imagem do oponente perante a sociedade (VILLA, 2019). Apesar desses fatores, a população assistia de perto aos acontecimentos da batalha e vivenciava diariamente o medo e a incerteza que surgem em momentos de conflitos. Villa (2019) traz em seu livro fragmentos dos relatos do cientista dinamarquês Peter Lund (1982), morador de Lagoa Santa, demonstrando o reflexo dos conflitos no dia a dia da sociedade mineira.

O paraíso terrestre (...) tornou-se palco de cenas que me encheram de repulsa e pavor. (...) ninguém em casa veio a ferir-se, apesar das balas que assobiavam perto dos nossos ouvidos (...) neste momento, quando escrevo isso, reina um silêncio sepulcral em torno de mim, todas as casas fechadas, as ruas vazias, nenhuma viv’ alma é vista. Alguns corpos ainda estão espalhados aqui e ali; os abutres, que nos dias de tumulto anteriores tinham  desaparecido,  já  se  deixam  ver,  mas  eu  antecipo  no  trabalho  principal  de recolher e enterrar os cadáveres. O Sol de Lagoa Santa se pôs pra mim.(LUND, 1842, apudVILLA, 2019, p.9).

Além  disso,  o  autor  também  traz  outras  histórias  acerca  de  eventos  ocorridos  nesse período de confrontos, como saques e roubos às propriedades oponentes e assassinatos de civis. Uma  das  fontes  primárias  consultadas  pelo  autor,  e  que  chama  atenção  pela  absurdez,  é  que atribuíram como causa da morte de Dona Francisca Marcianna de Assis e Castro, o “susto da revolução” VILLA, 2019, p. 10, grifo do autor).

Diante  do  exposto,  percebe-se  que  a  população  esteve  exposta  às  agruras  do  conflito entre liberais e conservadores pelo domínio político do Império. A última batalha da Revolução Liberal, ocorrida em Santa Luzia, fazia parte de um projeto muito maior, que envolvia outras regiões  do  Brasil,  como  a  província  de  São  Paulo e  o  império  como  um  todo.  Motivada  por insatisfações com as políticas palacianas e conservadoras, como registrado por Barroso (1954): “[...] o que os liberais pleiteavam na verdade era pura e simplesmente o poder político [...] sobre o Império” (BARROSO 1954, p.46).

A REVOLUÇÃO LIBERAL E SUAS VERTENTES HISTORIOGRÁFICAS

Ao  nos  debruçarmos  sobre  a  historiografia  mineira,  encontramos  mitos  criados  e generalizações  que  forjam  uma  imagem  de  uma  estagnação  sociocultural  e  econômica  da província  mineira,  principalmente  durante  o  séculoXIX.  Eduardo  Paiva  (2009),  em  seus estudos  na  década  de  80,  nos  mostra  uma  vertente  que  foge  desse  tradicionalismo,  sendo precursor  de  estudos  revisionistas  que  trazem  uma  Minas  Gerais  oitocentista  dinâmica,  com inúmeras relações entre si e que apresenta peculiaridades regionais.

Os estudos revisionistas demonstram uma maior interpretação local da história mineira, priorizando as relações da sociedade mineira entre si, em contraponto a uma história tradicional marxista com menor foco regional, mostrando que a sociedade mineira se encontrava longe de estar estagnada, por exemplo. Utilizando-nos do prisma local, podemos compreender melhor as dinâmicas sociais de determinado  contexto  histórico,  fugindo  assim  de  estereótipos  e,  também,  desconstruindo narrativas criadas que, na verdade, pouco fazem sentido com a localidade, dando ênfase então a  uma  pluralidade  de  estudos,  fazendo  surgir  novos  sujeitos  que  são  excluídos  e  esquecido quando  se  prioriza  grandes  personagens.  Portanto,  a  perspectiva  local,“[...]  procura  também entender  a  maneira  como  movimentos  ou  transformações  coletivos  são  possíveis,  mas  não  a partir desses movimentos em si e da capacidade autorrealizadora que se lhes imputa, e sim da parte que cada ator toma neles. [...]”(REVEL, 2010, p. 440).

Após  a  contextualização  do  arraial  e  da  batalha  nele  ocorrida,  sustentando-se  neste caráter local, buscou-se enfatizar uma diferença de visões históricas da Revolução Liberal de 1842, e da última batalha ocorrida no arraial luziense, mostrando as diferentes perspectivas da batalha,  de  como  ela  é  estudada  e  concebida  através  de  ângulos  que  priorizam  uma  análise macroestrutural,  ou  seja,  sua  relação  direta  com  as  tensões  que  vivia  o  Império  brasileiro naquele  momento,  e  os  sentidos  que  esta  batalha  final,  que  pôs  fim  à  revolta,  possui  para  a história de Santa Luzia.

A  historiografia,  que  prioriza  uma  análise  local,  evidencia  temáticas  regionais  e  uma pluralidade na sociedade. Difundida principalmente pela Escola dos Annales, a história local utiliza-se de uma variedade de fontes que foram possíveis através da interdisciplinaridade, que se  refere  prática  de  um  campo  do  saber  apropriar-se  de  metodologias  ou  aportes  teóricos  de outro  campo  de  saber  constituindo  um  diálogo,  inaugurada  pela  escola  histórica  francesa, mostrando novos sujeitos e novos problemas. Vejamos:

Há   muito   a   historiografia   vem   considerando   que   as   realidades   criadas   pelas experiências da atividade humana não podem ser somente analisadas a partir de seus aspectos    globalizantes,    mas,    também,    dentro das    suas    particularidades    e singularidades,  que  se  manifestam  principalmente  e  de  forma  riquíssima  no  nível local.  Essa  nova  postura  difundida  de  forma  generalizada  pela  escola  dos  Annales, possibilitou  a  abertura  de  novas  fronteiras  interpretativas,  ampliando  o  campo  das fontes documentais, e estabelecendo novos horizontes para as investigações, entre os uais destacam-se a análise da realidade local, sem perder de vista, é claro, o conjunto da sociedade. (CARVALHO, 2007, p.).

A historiografia  tradicional  narra  os  eventos  da  Revolução  Liberal  de  1842  numa perspectiva  macroestrutural, e destaca  os  grandes  feitos  de  Caxias,  apresentando  as  decisões tomadas pelo futuro Duque, e como ele reprimiu, a mando do Imperador Dom Pedro II, os focos rebeldes  em  São  Paulo  e  Minas  Gerais, demonstrando  a  representação  dessa revolta  para  o Império, no âmbito político. 

Os conflitos armados ocorridos, em 1842, nas províncias paulista e mineira, derivaram da insatisfação dos liberais com as tomadas de decisões do Imperador que, após subir ao trono com  o  Golpe  da  Maioridade,  em  1840,  e  conduzir  os  liberais  ao  poder  político,  em  1841, dissolveu  a  câmara  liberal  e  elegeu  um  novo  ministério  alavancando  o  poder  ao  Partido Conservador, após crises políticas e econômicas que o Brasil sofria naquele momento. Análises  históricas  oficiais  narram  os  eventos  desta  revolta  privilegiando  grandes figuras como o Imperador Dom Pedro II, através de seus impactos diretos na política imperial, não  dando  espaço  às  transformações  que  as  batalhas  travadas  entre  as  tropas  liberais  e conservadoras promoveram nas cidades em que elas ocorreram. 

Os  desdobramentos  dessa  reflexão  estão  em  consonância  com  as  representações  que privilegiam a imagem de que o Brasil foi (e é) um país pacífico, onde os processos políticos e sociais aconteceram de forma controlada e sem grandes rupturas. Entretanto, essa perspectiva não foi unânime entre os eruditos brasileiros durante todo o tempo. Os eventos que aconteceram no período regencial dividiram a escrita, e consequentemente, a representação dos eventos pelas elites.  

O  período  regencial  foi  visto  como  anárquico  e  anômalo  e,  portanto,  prejudicial,  por políticos  conservadores  como  Justiniano  José  da  Rocha  (o  Visconde  do Uruguai),  Pereira  da Silva,  Moreira  de  Azevedo  e  Joaquim  Nabuco  que  acusavam  o  momento  instável  como prejudicial  à  formação  e  desenvolvimento  da  nação.  Para  os  liberais  como  os  irmãos  Ottoni, Theophilo e Cristiano Benedito, além de Francisco de Salles Torres Homem e Tavares Bastos, foi consolidada uma imagem mais progressista do período, como um momento de inspiração e singular na História brasileira pela consagração das liberdades e pelo papel necessário dessas liberdades para o progresso nacional. 

O  historiador  Lúcio  José  dos  Santos,  por  exemplo,  em  sua  conferência  no  Instituto Histórico  Geográfico  Brasileiro  (IHGB)  no  ano  de  1942,  fez  uma  exposição  da  batalha, buscando criar uma narrativa oficial do evento, centrada nos interesses do partido liberal e sua insatisfação  com  as  parcelas  conservadoras,  narrando  os  interesses  e  vontades  dos  principais homens que organizaram a revolta de forma factual e privilegiando os embates militares entre os  revoltosos  e  as  tropas  de  Caxias.  Além  disso,  segundo Gama  (2020), o  historiador  emite juízos de valor à narrativa, devido à suas perspectivas cristãs, pautadas em valores de progresso.

Historiadores como Aluísio de Almeida, José Antônio Marinho e Martins de Andrade também  trabalham  a  história  da  Revolução  Liberal  de  1842,  sobrepondo  os  seus  aspectos políticos e narrando como ocorreram as batalhas, sem fazer uma análise pormenorizada sobre como  essa  revolta  influenciava  a  sociedade  das  cidades  nela  envolvidas,  e  privilegiando  os grandes atores políticos como Teófilo Ottoni, entre outras lideranças.

Outra   contribuição   interessante   é   de   Alexandre   Mansur   Barata,   que,   em   uma Comunicação à Associação Nacional de História (ANPUH, 2011), destacou que a Revolução Liberal de 1842 possibilitou a identificação de formas de atuação e das estratégias utilizadas na conflituosa  relação  entre  o  Poder  Central  e  as  oligarquias,  principalmente  a  mineira.  Ele analisou  o  movimento  de  1842  como  um  movimento  de  insatisfação  dos  liberais  e  da possibilidade  de  “pegar  em  armas”  com  a  formação  de  uma  sociedade  secreta  intitulada “Patriarcas Invisíveis”, formada por monarquistas que se afirmavam como cidadãos na defesa do direito de insurreição diante da opressão de um governo autoritário. 

Defendiam a monarquia, mas  se  posicionavam  contra  os  recuos  propostos  pelo  Gabinete  Palaciano  que  ameaçariam  o progresso com os retrocessos ao Ato Adicional de 1834.Barata  (2011)  destaca  que  a  expectativa  é  que  a  Revolta  se  transformasse  em  Guerra Civil unindo São Paulo e Minas contra as forças “regressistas” e explicita o caráter simbólico das  lutas  de  ambos  os  lados,  demarcando  as  identidades  políticas  em  disputa.  

Dessa  forma, ampliou  a  reflexão  para  um  espaço  temporal  mais  duradouro  (1834-1844),  analisando  o questionamento à política centralizadora, as disputas entre o poder central e o poder local e os arranjos e rearranjos das elites provinciais diante dos acontecimentos do período. Também interessante é a análise construída por Valéria Cristina Rodrigues (2006) em sua monografia, na qual, além de investigar as razões políticas e as bases do movimento e como se deu a batalha e suas influências na província mineira, também constrói um estudo acerca do termo Revolução que este evento histórico carrega, já que este movimento não visava romper bruscamente com a estrutural imperial. Há também estudos promovidos por historiadores militares sobre a revolução, como é o artigo de Daróz (2014) na Revista Militar. 

O historiador constrói sua narrativa destacando os feitos dos militares envolvidos na batalha, de que forma esses influenciaram na consolidação do  Império  e  como  “as  operações  militares  realizadas  em  São  Paulo  e  Minas  Gerais  e, principalmente, a ação de comando de Caxias, foram ricas em ensinamentos”. (DARÓZ, 2014, 572).Periódicos também retratam os acontecimentos da revolução através de umanarrativa linear  dos  eventos  ocorridos.  

A  revista “O  Cruzeiro” do  ano  de  1954  traz  um  texto  sobre  a revolta,  que,  ao  expor  os  principais  acontecimentos,  destacando  as  ações  dos  combatentes, como reuniões e encontro secretos dos revoltosos, narra as estratégias e ainda revela uma carta colocada como inédita, revelando os sentimentos de Caxias com relação as batalhas.

Com um estudo local com a intenção de demonstrar como a batalha final, em 1842, no arraial de Santa Luzia, agitou a sociedade do pacato arraial, o historiador luziense Gustavo Villa (2019)  em  seu  livro “Horizonte  de  eventos  da  Batalha  de  Santa  Luzia”,  mostra  como  esta batalha final causou transtornos e transformou a vida dos habitantes luzienses.

Último local de resistência dos “luzias”, Santa Luzia tornou-se palco de  uma batalha que  envolveria  a  população  que  habitava  as  ruas  principais.  No  estudo  de  Villa  (2019),  são mostrados  os  sentimentos  das  pessoas  que  presenciaram  e  participaram  das  lutas,  como  elas auxiliavam  as  tropas  liberais  e  temiam as  tropas  de  Caxias  devido  aos  saques  e  à  destruição promovidos  por  ele.  Também  são  corrigidos  alguns  erros  históricos,  como  o  local  final  da batalha que, no imaginário, teria ocorrido no Muro de Pedras –local turístico preservado como patrimônio  municipal –quando,  na  verdade,  não  foi.  

Além  disso,  narrativas  circulam  na memória local até hoje sobre este evento, além de que há marcas da batalha em alguns casarões. Essa  perspectiva  localista  nos  dá  uma  dimensão  de  como  um  evento  que  influenciou diretamente a política imperial, foi vivido de uma maneira diferente pela população de Santa Luzia. 

Nos outros trabalhos citados, é nítido o foco na vitória do exército de Caxias e como eles contiveram os focos rebeldes, porém os luzienses, como expôs Villa (2019), eram muito mais próximos dos liberais do que das tropas que “lutavam” pelo Império. Ou seja, uma luta política que resultou em uma vitória do Império, foi percebida pelos habitantes locais como uma derrota devido às consequências promovidas.


Fonte: Revista História em Curso, Belo Horizonte, Dez. 2022 –ISSN: 2178 -1044 

Autores: Pedro Luiz Teixeira de Sena& Gabriella Nunes Claudio 

Santa Luzia e as perspectivas da Revolução Liberal de 1842

 REFERÊNCIAS

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ASSUNÇÃO, Caio Franco. As relações de Santa Luzia/MG com a geo-história do Brasil e da economia-mundo capitalista entre os séculos XVIII-XIX.Revista GEOgrafias,v.28, n.2, Belo Horizonte, 2020.

BARATA, Alexandre Mansur.Política provincial e a construção do estado nacional brasileiro: Minas Gerais (1834-1844)In.: SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA –ANPUH, 26., 2011,São Paulo. Anais [...]. São Paulo:ANPUH,2011. Disponível em http://www.snh2011.anpuh.org/resources/anais/14/1308163485_ARQUIVO_Anpuh2011(AlexandreMansurBarata)2.pdf

BARROS, José D’Assunção. A escola dos Ananales: considerações sobre a História do Movimento. 2010.

BARROSO, Gustavo. A Revolução Liberal em S. Paulo e Minas -A ação dos patriarcas invisíveis -Tudo se acabou em Santa Luzia do Rio das Velhas-Carta inédita de Caxias. In.: Revista O Cruzeiro. Rio de Janeiro. Edição: 0051. Ano: 1954.

BORSAGLI, Alexandre. CASTRO, José Flávio Morais. Sítio e posição geográfica do arraial de belo horizonte –MG:uma análise geográfica-histórica.Revista de Geografia (Recife) v. 36, n. 2, 2019

CARVALHO, José Murilo. Os Bestializados-O Rio de Janeiro e a república que não foi.Editora: Companhia das Letras. 2019.

CARVALHO, Carlos Henrique de. A histórialocaleregional:dimensõespossíveis paraosestudoshistórico-educacionais.Cadernos de História da Educação–n. 6 –jan./dez. 2007.

CORREA, Carolina Perpétuo. “Por que sou um chefe de famílias e o senhor da minha casa”:proprietários de escravos e famílias cativas em Santa Luzia, Minas Gerais, século XIX.Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em História da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte. 2005

DARÓZ, Carlos Roberto Carvalho. As revoltas liberais de 1842: O Império Consolidado. Revista Militarn. 2549/2550–jun./jul. 2014, p.565 -575.

DOSSE, François. História em migalhas:dos Annales a Nova história.Bauru, SP. EDUSC. 2003.

GAMA, Luciana Coelho. As Revoltas Liberais de 1842 na perspectiva do historiador Lúcio José dos Santos: usos e abusos da memória.Cadernos de História, Belo Horizonte, v. 20, n. 32, 2020.

PAIVA, Eduardo França. Minas depois da mineração [ou o século XIX mineiro].In: GRINBERG,Keila. SALLES, Ricardo (Orgs). O Brasil Imperial-v. I -1808 -1831. Civilização Brasileira. Rio de Janeiro. 2009.

SOUZA, Valéria Cristina Rodrigues de. A “Revolução” de 1842.Trabalho de Conclusão de Curso. Departamento de História. Universidade Federal de Ouro Preto. Mariana, MG. 2006

REVEL, Jacques. Micro-história, macro-história: o que as variações de escala ajudam a pensar em um mundo globalizado.Revista Brasileira de Educação. v.15. n .45. 2010.

VILLA, Gustavo.Horizontes de eventos da batalha de Santa Luzia:aspectos sociais e arqueológicos. Santa Luzia. 2019

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A família de Santos Dumont em Santa Luzia

 

A história de Santos Dumont, começa na cidade de Santa Luzia, tendo em vista que sua família liderada por seu pai, Henrique Dumont, residiu na Fazenda da Jaguara, as margens do Rio das Velhas, até dezembro de 1872, data de sua transferência para o Distrito de Palmira, em Barbacena (atual cidade de Santos Dumont) local que foi responsável pela construção da linha férrea Dom Pedro II e onde no dia 20 de julho de 1873, nasceu Alberto Santos Dumont. 

 Dr. Henrique Dumont, pai de Santos Dumont, juntamente com seu sogro, o Comendador Paula Santos, que era um minerador, um homem de fortuna e de muito conceito na corte do Imperador, adquiriram junto a Coroa a grande Fazenda da Jaguara, situada as margens do Rio das Velhas, onde se se supunha encontrar ouro e outros metais, porém, veio a encontrar somente calcário e madeiras que eram vendidas para a Mina do Morro Velho, de Congonhas do Sabará, hoje a cidade de Nova Lima.

 Ainda quando residindo em Santa Luzia, Dr. Henrique Dumont trabalhou como engenheiro na construção do novo trecho Estrada de Ferro Dom Pedro II na cidade de Sabará, onde também foi responsável pela construção da ponte de madeira sobre o rio da Velhas. Foi responsável também pela construção da ponte de madeira que dava acesso a cidade de Santa Luzia e que ligava uma margem do Rio das Velhas a outra, onde hoje se encontra a Avenida do Carmo. 

 Na fazenda da Jaguara, Dr. Henrique Dumont, em 1869 iniciou a construção do primeiro barco a vapor a navegar pelo Rio das Velhas e pelo Rio São Francisco, o Saldanha Marinho, e dando inicio a suas atividades no ano de 1871. 

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 No município de Santa Luzia, na Fazenda da Jaguara, localizada hoje no município de Matozinhos, nasceram três de seus irmão, Virgínia Santos Dumont, em 1866, Luiz Santos Dumont, em 1869 e Gabriela Santos Dumont, em 1871.

 A Família de Santos Dumont deixou Santa Luzia/MG no final de 1872, já com a Sra. Francisca Paula Santos, esposa de Dr. Henrique Dumont, já carregando em seu ventre Alberto Santos Dumont, o futuro pai da aviação, rumo ao Distrito de Palmira, município de Barbacena, hoje, a cidade de Santos Dumont.

Estação de Carreira Comprida em Santa Luzia MG

 


A tradição viva da bravura mineira. Assim o poeta Olavo Bilac definiu Santa Luzia, antigamente conhecida como Santa Luzia do Rio das Velhas. Assista ao interessantíssimo programa Estações da Rede Minas em Santa Luzia. O programa conta a história de quatro estações locais e suas diferentes realidades, da demolição ao funcionamento como estação da FCA (Ferrovia Centro-Atlântica). 

https://www.enjoei.com.br/@vitrineraros


A tradição viva da bravura mineira. Assim o poeta Olavo Bilac definiu Santa Luzia

 

A tradição viva da bravura mineira. Assim o poeta Olavo Bilac definiu Santa Luzia, antigamente conhecida como Santa Luzia do Rio das Velhas. Confira abaixo o texto do poeta:

À diminuta distância da estação, ao alto, está a cidade de Santa Luzia, célebre na história de Minas por ter sido nela travada a última batalha da famosa revolução liberal de 1842 jugulada a custo pelo Duque de Caxias. É uma pequena cidade que não difere do comum das cidades do interior: uma rua comprida, calçada, tendo ao fundo a matriz, com outras ruas irregulares que a cortam. Em certas casas, vêem-se os sinais das balas de 42 e, modesta como é na aparência, Santa Luzia é uma tradição viva da bravura mineira, lembrando essa revolução popular que o exército do governo só conseguiu sufocar, dificilmente, graças à traição que entregou a Caxias o último reduto dos revoltosos.

Depois do jantar, montamos a cavalo. Declina a tarde. Um vento fresco sacode as árvores. Deixamos a estação do Rio das Velhas entregue ainda à sua agitação comercial: sobre a lama da estrada trotam tropas de bestas, com a madrinha à frente, de campainha tilintando ao pescoço; rincham carros de bois, morosamente ao passo tardo das juntas que se atolam; e carroças carregadas de fardos ficam paradas, sem animais, rodeando a gare, onde manobra uma locomotiva, silvando.

De propósito, contemos os cavalos, caminhando a passo. Uma doçura indescritível paira no ar. O crepúsculo cai. Sobe uma coluna de ouro e púrpura no ocaso. Uma primeira estrela, Vênus, palpita ao fundo do horizonte. Cantam águas correntes dentro de moitas cerradas.

E já é noite completa, e o luar espia por detrás de uma montanha, quando ao fundo do terreiro da fazenda das Lages, avistamos a grande casa branca, de janelas iluminadas, rasgando-se para a varanda amplíssima, de onde golfam para a noite vozes e risadas de crianças, de envolta com as notas de um piano…


Relevo na margem da estrada que liga Belo Horizonte a Santa Luzia 1958

 


Autor: Guerra, Antonio Teixeira, 1924-1968; Jablonsky, Tibor
Título: Relevo na margem da estrada que liga Belo Horizonte a Santa Luzia (MG)
Local: Belo Horizonte
Ano: 1958
Descrição física: original,p&b,acidificada
Série: Acervo dos trabalhos geográficos de campo
Notas:
Negativo 6464. Leito de seixos de quartzo com certo polimento, alguns angulosos e concreções ferruginosas.

Assuntos:
Belo Horizonte (MG); Estradas; Minas Gerais; Quartzo; Relevo (Geografia


Antigo Prédio da sede da Prefeitura de Santa Luzia

 


Sede da prefeitura mudou de lugar nos anos 90 após o ex prefeito Carlos Calixto ter a idéia de utilizar o prédio do antigo frigorífico frimisa (falido) como sede permanente.  

Muro de Pedras, recanto dos bravos, Monumento ao Duque de Caxias Santa Luzia MG

 


Nesta colina, outrora conhecida como Tamanduá, caminho para Sabará, estiveram os revolucionários liberais, atrás das trincheiras defensivas e ao longo de sua encosta e sopé, a fim de deter o avanço do Exército Imperial Pacificador. Terminada a revolução ficou popularmente conhecido como “Muro de Pedras”ou “Trincheira dos Revolucionários “. Em 1942 o governo de Estado em resgate à história nacional edificou um marco comemorativo.
Em 1978, a Prefeitura de Santa Luzia, deu o nome de “Recanto dos Bravos”. Área de preservação ambiental e histórica. Todos os anos de acordo com decreto estadual e municipal é comemorado o término da Batalha de 1842, em solo luziense.

Endereço: Alto do Tamanduá, s/n. Córrego das Calçadas.
Horário: sem restrição.


Fotos Históricas: Antiga estação de tratamento de água

 


Inscrição na foto: Estação de tratamento de água com capacidade de 11.000.000 - vazão de utilização de 750 litros/segundo.




Fotos Históricas: Vista Panorâmica de Santa Luzia parte histórica região Rua Direita

 


Data desconhecida

História do Matadouro Frigorífico Frimisa, atual prédio da Prefeitura de Santa Luzia

 


A sede da prefeitura de Santa Luzia, em Minas Gerais, já abrigou um famoso matadouro e frigorífico, a Frigoríficos Minas Gerais S/A (FRIMISA). O município foi escolhido com base em alguns fatores: a proximidade com um grande mercado consumidor (região de Belo Horizonte); a infraestrutura de transportes rodoviários e ferroviários; a disposição de um espaço para receber o frigorífico, cujo porte demandaria uma configuração técnica considerável para o processamento industrial. Em 1959 foram iniciadas as atividades de abate na recém-construída estrutura, localizada no Distrito Industrial de Carreira Comprida.

A Frimisa foi constituída pelo governo de estado a fim de promover o desenvolvimento do setor de industrialização de carnes em Minas Gerais, buscando explorar de forma mais eficiente os recursos existentes, e as potencialidades da pecuária de corte, visto que a produtividade desse setor era baixa. Anteriormente, funcionava da seguinte maneira: as etapas da produção da carne, desde a cria e engorda até o abate, eram espalhadas por vários pontos do estado; um dos agravantes desse fator era a distância em que os animais ficavam para com os pontos de embarque nas estações ferroviárias, tendo que fazer longas marchas, que chegavam a 6 dias, o que junto ao embarque do rebanho vivo ocasionava altos índices de mortalidade.  Assim, buscou-se a implantação de frigoríficos nas próprias zonas produtoras, tirando o máximo aproveitamento do animal: não somente a carne seria direcionada para a indústria, mas também os ossos, o couro, os miúdos, a gordura.

A Frimisa foi um empreendimento de grande porte: o seu conjunto industrial era composto pelo matadouro, o frigorífico, os edifícios auxiliares, e a infraestrutura adicional. O matadouro abrangia 4 pavimentos de um edifício; o frigorífico, por sua vez, abrangia 5 pavimentos de outro edifício, e ambos eram ligados entre si. Os edifícios auxiliares compreendiam a casa das caldeiras, a casa das máquinas, a carpintaria, a oficina mecânica, o almoxarifado, a garagem, o prédio auxiliar da indústria, o galpão de charque, o posto de manutenção dos veículos, o posto de desinfecção dos vagões, a casa de guarda, os depósitos de combustíveis, os vestiários e lavanderia, as pocilgas, o restaurante. A infraestrutura auxiliar abrangia a linha férrea com os respectivos desvios ferroviários. A localidade do bairro, hoje denominado Frimisa, acolheu vários operários do frigorífico com suas respectivas famílias. Quanto à questão da enorme quantidade de água que o funcionamento da estrutura requeria, foi sanada através de um sistema de captação e tratamento que era abastecido no Rio das Velhas; apesar disso, os despejos eram transferidos para o mesmo Rio das Velhas, sendo que o único tratamento dispensado era o sistema de decantação do esgoto industrial, para separação da gordura.

O planejamento, com os primeiros traçados oficiais para a implantação do Frimisa, começou por volta de 1947, em que surgiu a Comissão de Estudos da Rede de Frigoríficos e o poder executivo foi autorizado a promover fomentos à produção, por meio do Decreto-Lei nº 2153/1947. Em 1953 deu-se a criação legal da empresa, através do Decreto nº 3981/1953. Em 1952 as obras de instalação foram iniciadas em Carreira Comprida- Santa Luzia. Alguns anos depois, em 1955, foram interrompidas pelo primeiro incêndio nas dependências do Frimisa, sendo retomadas até a sua efetivação no ano de 1959. Em 1960 houve a inauguração do conjunto industrial; a cerimônia contou com a presença do governador Bias Fortes, Tancredo Neves e o bispo de Belo Horizonte.

O período mais produtivo do empreendimento foi aquele compreendido entre os anos de 1963 a 1972, quando os números de rezes abatidas equivaliam a mais de 20.000 toneladas por ano. A partir de 1977 começou o agravamento da situação financeira da Frimisa. Para se ter idéia, em 1983 a margem de lucro não era suficiente para cobrir nem os custos operacionais da empresa. Dentre os fatores que acarretaram esse declínio estavam o alto custo operacional, as falhas de dimensionamento do projeto, o comprometimento de equipamentos, o abastecimento de água provindo de um local altamente poluído, as mudanças no setor de industrialização de carnes no país, tanto na demanda dos produtos quanto na oferta e no grau de competitividade, além da proliferação de subchefias e suspeitas de desvios de recursos na empresa. Por fim, a diminuição da escala de produção atingiu níveis mínimos, e em 1988 uma avaliação técnica das condições de funcionamento do Frimisa concluiu que o empreendimento era inviável economicamente, sendo a desativação a única alternativa restante.

O espaço da Frimisa ficou votado ao abandono por 10 anos. Ao final da década de 90, a prefeitura municipal de Santa Luzia foi transferida para as instalações do antigo frigorífico, no distrito de Carreira Comprida. No ano de 2015 outro incêndio no local teve lugar, e só foi controlado depois de 6 dias de combate às chamas. Esse acontecimento, somado a outros fatores, comprometeu em partes a estrutura dos prédios. Em 2019, no entanto, foi feito o inventário do conjunto do antigo frigorífico, que passou a ser protegido com base no art. 216 de nossa Constituição Federal.

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